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Porto de Santos, uma Bomba Prestes a Explodir

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21/01/2016

       Na última quinta-feira um acidente químico com dicloroisocianurato de sódio (composto frequentemente utilizado na produção de desinfetantes e na limpeza de piscinas) tomou de assalto, em pleno horário nobre, a atenção de vários noticiários nacionais assim como da mídia escrita. Segundo a imprensa, o acidente ocorrido na margem esquerda do canal de acesso ao porto de Santos,foi resultado da infiltração de água da chuva em um contêiner onde a substância estava armazenada. A nuvem de fumaça formada pela reação química altamente exotérmica (geradora de calor) cobriu bairros inteiros de várias cidades da Baixada Santista. Embora a Local frio (empresa responsável pelo armazenamento do produto) tenha informado que o composto não era tóxico, dezenas de pessoas,moradoras das áreas atingidas, procuraram atendimento médico com queixas de irritação na pele e mucosas. Em pleno sábado pela manhã, dois dias após o início do acidente, uma densa nuvem com forte cheiro de cloro era percebida pairando sobre bairros de Santos.

O episódio relatado é apenas mais um entre vários ocorridos recentemente em empresas que fazem uso dos terminais do porto de Santos. Em 2 de abril de 2015 o maior incêndio registrado em áreas industriais do Brasil e o segundo maior no mundo consumiu durante 9 dias, milhões de litros de combustíveis armazenados pela empresa Ultracargo. Esse incidente causou o derramamento de várias toneladas de substâncias químicas (usadas no combate ao incêndio) e resíduos de hidrocarbonetos nas águas do estuário de Santos. Como consequência,morreram aproximadamente 10 toneladas de peixes e danos ambientais de difícil reparo foram causados aos ecossistemas locais. Some-se a essa conta, outros dois incêndios de grandes proporções que atingiram armazéns de açúcar de Santos em anos recentes. Dessa forma, os frequentes sinistros ocorridos nos terminais do porto de Santos têm passado a população a sensação de estarmos sentados sobre uma bomba relógio prestes a explodir.

Os acidentes químicos de grande vulto, causam grande comoção popular e apelo midiático. Entretanto, do ponto de vista científico eles são quantitativamente menos impactantes para o ambiente do que os pequenos lançamentos, vazamentos e incidentes diários. Esses impactos crônicos ocorrem temporalmente de forma geralmente ininterrupta e são responsáveis pelo lançamento de milhões de toneladas de substâncias químicas perigosas na atmosfera e no mar. Por exemplo, as emissões tóxicas de toda a frota de veículos do estado de São Paulo durante alguns meses são provavelmente maiores que o liberado durante o incêndio da Ultracargo. De forma similar, as toneladas dedicloroisocianurato de sódio que reagiram durante o acidente na Local frio,lançaram menos resíduos de cloro no ambiente do que o despejado diariamente como resultado do uso desse mesmo produto como detergente.Nas duas situações a atividade de empresas gera muito mais impactos ambientais que as domésticas, ou seja, o principal culpado pelos danos é um só. Além disso, no caso do porto de Santos os acidentes químicos que deveriam ser exceção, parecem está se tornando a regra.

Embora muitas pessoas não saibam, o sistema estuarino onde estão instalados o Porto de Santos e o polo industrial de Cubatão ainda abriga várias espécies de peixes além de tartarugas marinhas e até jacarés. A presença dessas espécies é uma evidência de que, apesar dos impactos crônicos e dos acidentes industriais frequentes, uma parte da diversidade do passado ainda resiste, certamente a duras penas. A região é uma das mais impactadas do país sofrendo com lançamentos crônicos de várias contaminantes e abrigando um passivo ambiental resultante de décadas de atividade industrial mal regulamentada. As margens do estuário vivem em aglomerados subnormais (unidades habitacionais em sua maioria carentes de serviços públicos essenciais)milhares de famílias que muitas vezes retiram seu sustento do manguezal. Para essas pessoas, a pesca e a coleta de mariscos e caranguejos representam a principal fonte de renda e alimento. Mas o alimento retirado de uma local altamente contaminado não estaria também contaminado?

A resposta para essa pergunta é, sim. Embora existam poucos estudos sobre o assunto, um relatório publicado em 2001 pela CETESB (Companhia de Tecnologia de Saneamento Ambiental) mostrou que em algumas espécies comestíveis (de ostras, mexilhões e peixes) os níveis de determinados contaminantes estavam acima dos valores considerados seguros por agências ambientais brasileiras e canadenses.É importante ressaltar que esse estudo foi realizado com um número limitado de substâncias químicas perigosas e outros contaminantes não analisadas poderiam estar presentes no alimento. Essas moléculas podem produzir efeitos devastadores na saúde humana se ingeridas com regularidade. Entre esses efeitos mais comuns em humanos estão danos embrionários, cânceres, redução de imunidade e alterações reprodutivas.Considerando que esse alimento contaminado é consumido regularmente pela população local,é possível que estejamos diante de uma grave e silencioso problema de saúde pública. O uso do “grave o silencioso” na frase acima é proposital, visto que, não existem, na região, estudos epidemiológicos buscando relacionar a ocorrência dessas doenças a exposição a poluentes.

Sendo assim, considerando a infinidade de compostos químicos potencialmente prejudiciais que são vertidos diariamente ou através de acidentes como os relatados acima, o medo da população da Baixada Santista de estar sobre uma bomba prestes a explodir é em parte justificado. Por outro lado, para mim a bomba química representada pelo retorno dessas substâncias para população humana através do alimento e da água contaminados já explodiu silenciosamente.

*Biólogo, Doutor em Oceanografia, Professor do Instituto do Mar da Universidade Federal de São Paulo. 




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