Passaram-se trinta anos desde a refundação do PSB em 1985, e este tempo permite uma leitura histórica. Para entender como chegou a ser um partido socialdemocrata, um partido de centro como o é de fato hoje, torna-se necessário entender a evolução partidária no Brasil a partir do fim da predominância do regime militar. A oposição ao regime militar colocou uma grande parte de movimentos e partidos políticos na esfera da democracia processual. Quantos deles visavam e defendiam a democracia como princípio e valor? Desde o PT, passando pelo PDT, pelo PCdoB, esta pergunta já tem uma resposta se não definitiva, pelo menos lógica: a autodefinida esquerda se tornou a opção para a governabilidade almejada pela direita. Governabildade e oportunismos caracterizaram partidos que, no início da década de 1980 se apresentavam como de esquerda ou socialistas.
O PSB, em sua refundação, teve que escolher entre ser um partido socialdemocrata, proposta defendida por uma considerável parte dos que estavam interessados na sua refundação e a proposta de socialismo democrático, herança histórica. Prevaleceu, em coerência com seu passado pré-regime militar, o socialismo democrático.
A necessidade e perspectiva de uma solidez eleitoral demandada pelo sistema político levou a direção partidária a entregar o partido a um destacado líder nacionalista e progressista: Miguel Arraes. Sua liderança indiscutível e nada preocupada com a valorização da democracia socialista deu início ao período do centralismo que se caracterizou, na maioria dos partidos de esquerda brasileiros, pela presença de um líder acima do próprio partido (Brizola, Lula, Carlos Prestes, Roberto Freire, entre outros, são exemplos desta peculiaridade dos partidos desta esquerda brasileiros). Eduardo Campos deu perfeita continuidade a este tipo de centralismo político até se tornar o “projeto” do PSB: projeto eleitoral e de real possibilidade de conquista da presidência do Brasil. Nesta reta de conquista da presidência o PSB passou por uma incorporação de dirigentes estaduais nada identificados com a ideologia do socialismo democrático e com uma política de aproximação com partidos de direita, trajetória bruscamente e improvisamente interrompida com a aliança com a REDE em 2013 que o levou a retornar um pouco à sua origem.
Com a trágica morte de Eduardo Campos inicia-se no PSB uma nova fase, desafiadora: o PSB vai voltar a ser um partido de centro-esquerda ou vai se consolidar como partido de centro-direita? A questão é mais do que pertinente não do ponto de vista filosófico, mas pela atual composição de seus membros.
Os socialistas, que estão presentes no PSB, mas que não o caracterizam, tem um grande desafio neste momento. Considerando que os socialistas, no Brasil e no mundo inteiro, agem de formas bem diferenciadas, às vezes se agregando em partidos radicalmente socialistas que não conseguem se solidificar eleitoralmente, outras vezes agindo no interior de partidos de centro, outras vezes formando partidos nominalmente socialistas, mas de fato mais socialdemocratas, podemos imaginar que no PSB não teremos grandes novidades.
Com a refundação o PSB deu grande valor aos imperativos eleitorais e secundarizou algumas características socialistas, principalmente a coerência e radicalidade democrática. Estudos acadêmicos mais específicos colocam o PSB como um dos partidos que, nestes trinta anos, mais se utilizou da nomeação de seus diretórios estaduais por parte da direção nacional, e conservou por mais tempo os mesmos nesta situação.
O partido se consolidou e cresceu em outras dimensões importantes, como na capacidade de administrar de forma exemplar cidades e estados, de defender princípios éticos, de propor novos valores políticos como a Transparência administrativa, de defender, em geral, propostas de interesse popular e das camadas mais exploradas. É por isto que hoje continua sendo um partido, no seu conjunto, entre os mais acreditados. Não se pode afirmar categoricamente que é um partido ideológico de esquerda.
Hoje percebem-se várias opções individuais: existem pessoas que apostam e lutam pela refundação socialista do partido, e outras que não acreditam mais na possibilidade de sua reconstrução. Cada pessoa sabe de sua capacidade de percorrer um ou outro caminho. Cada pessoas tem sua interpretação conjuntural e histórica: a que descrevo aqui é um simples ponto de vista e de análise, só um ponto. A renovação do PSB, mais do que uma iniciativa propiciada por um movimento interno, se tornou possível pela morte de seu líder que ditava de forma educada, mas firme, rumos, tempos de atuação, alianças, metas.
Os desafios são muitos, entre eles o de repensar historicamente a ideologia socialista, o de reconstruir a dimensão democrática deste partido concreto, o de coletivamente elaborar um projeto socialista para o Brasil. Este último desafio deveria ser o que deve fortalecer a densidade eleitoral do PSB e não o aliancismo partidário que caracterizou a política brasileira desde sua saída do regime militar.
Este fato inesperado abriu um espaço: cabe aos filiados socialistas torná-lo uma oportunidade de renovação socialista, antes que a história sepulte mais uma instituição que tentou avançar rumo ao socialismo que ninguém pode dizer de conhecer, mas que faz parte do sonho histórico da época em que vivemos.