Da: Redação*
Arethuza Figueiredo Henrique Silva de Aguiar. Esse é o nome da primeira mulher a se divorciar do país. Três dias depois da sanção da lei do divórcio, que ocorreu em 26 de dezembro de 1977, Arethuza e seu ex-marido foram ao cartório em Niterói para que pudessem converter o desquite – documento que encerrava a sociedade conjugal - em divórcio.
A homologação do pedido, obtida em um dia, virou notícia em todo o país. Também, pudera: até então o casamento era indissolúvel, muito por influência da igreja católica e de setores conservadores da época.
Arethuza, que é advogada e juíza de paz, conta em entrevista ao Migalhas que sempre foi uma divorcista ferrenha justamente porque acredita no amor: "Eu sempre acreditei e acredito no amor. Se eu não estava feliz, como outros milhares pelo país afora, nada mais digno e certo que saíssem de um casamento fracassado", afirma.
No ano em que a lei foi aprovada, os debates eram inflamados. A juíza de paz lembra de um programa, exibido pela extinta TV Tupi, no qual foi a única convidada para falar a favor do divórcio, em debate contra um padre e um jornalista antidivorcista. "Ali sim, foi um fogo cruzado", relembra.
O país se encontrava em plena ditadura militar quando o divórcio foi aprovado, no governo de Ernesto Geisel. O então presidente não se deixou abalar pelas influências da igreja católica porque era luterano. A sociedade, no entanto, estava dividida: de um lado, lideranças católicas convocavam os fiéis a protestar contra "a destruição da família brasileira". No front oposto, movimentos como a Campanha Nacional Pró-Divórcio defendiam a mudança, que, segundo eles, daria a milhões de brasileiros a chance de regularizar suas famílias.
Para Arethuza, o intuito nunca foi mexer com os dogmas da igreja e, sim, com a lei civil. Para ela, a possibilidade do divórcio era uma defesa que ia muito além dos interesses pessoais uma vez que tinha ciência das represálias que inúmeras pessoas sofriam, incluindo os filhos frutos de uma relação fora da lei:
"Onde não existe amor, continuar dentro do casamento é um engodo e eu sabia das inúmeras represálias das pessoas que se encontravam em outra união, com filhos desta união fora do casamento formal que sofriam nas escolas que frequentavam, na sociedade como um todo, precisavam de uma proteção do Estado laico."
Advogada, especializada em Direito de Família, além de conhecer muito bem àquilo a que se propunha, apesar de jovem na época, afirma que nunca deu, a quem quer que seja, o direito de se deixar desrespeitar por ser uma mulher separada. (Fonte: jornal O Globo, dezembro de 1977)