Por: Redação*
Um dos maiores produtores de cana-de-açúcar do mundo, o Brasil estuda um destino sustentável para o bagaço produzido pela indústria sucroalcooleira: a produção de carvão ativo que possa ser utilizado para a descontaminação da água e do ar. Em estudo pelo Laboratório Nacional de Nanotecnologia (LNNano), ligado ao CNPEM – Centro Nacional de Pesquisas em Energias e Materiais, o carvão ativo é uma alternativa economicamente viável, até 20% mais barata, e com a mesma eficiência, se comparada aos produtos importados já existentes no mercado.
O objetivo da pesquisa é utilizar resíduos agroindustriais abundantes no país para aplicações ambientais. De acordo com dados da Unica (União da Indústria de Cana-de-Açúcar), a produção brasileira de cana na safra 2015-2016 ultrapassou as 666 mil toneladas, das quais 368 mil foram produzidas no estado de São Paulo. Deste total, aproximadamente um terço consiste em bagaço que é obtido após o processo de moagem da cana nas usinas. “O resíduo da indústria sucroalcooleira abre caminho para o desenvolvimento de um material avançado com propriedades antibacterianas quando associado a nanopartículas de prata, sendo um excelente material na remediação ambiental”, explica o pesquisador Diego Martinez, do LNNano.
A pesquisa teve início a partir de uma demanda feita por uma usina nacional, que utiliza o bagaço de cana para geração de energia elétrica. O resíduo gerado na queima, bastante rico em carbono, passou a ser utilizado para a fabricação do carvão ativo.
No Brasil, carvões ativos são empregados em grandes volumes para a remoção das impurezas da água, por exemplo: para um município com 1 milhão de habitantes, a estimativa é que seja utilizada 1 tonelada de carvão ativo por dia para o tratamento de água. “O grande problema é que existe uma dependência do Brasil do mercado exterior para a obtenção desse produto. Se pensarmos na questão cambial, nosso sistema comercial fica muito fragilizado. O carvão produzido aqui pode ser até 20% mais barato que o importado”, enfatiza Mathias Strauss, do LNNano. No exterior, o carvão ativo é proveniente de madeira, ossos de animais ou casca de coco.
Através de uma cooperação bilateral firmada por meio do Centro Brasil-China de Pesquisa e Inovação em Nanotecnologia (CBCIN), o carvão produzido a partir da biomassa da cana já está em teste em Shangai, no país asiático. “O material está sendo utilizado em testes de descontaminação de ar, para por exemplo a despoluição do ar nos túneis da cidade, que sofrem com grandes congestionamentos - os carros ficam muito tempo parados gerando gases tóxicos. Esse ar passa por um tratamento para minimizar os danos para os motoristas”, elucida Strauss.
De acordo com os pesquisadores do CNPEM, o carvão ativo feito a partir de bagaço de cana já tem maturidade suficiente e deve estar disponível para o mercado em um prazo de cinco a dez anos.
Inovação
A pesquisa desenvolvida pelo Laboratório Nacional de Nanotecnologia, além de dar um destino mais sustentável e rentável ao resíduo gerado a partir da cana-de-açúcar, também tem caráter inovador por estudar a possibilidade de utilizar nanopartículas de prata associadas ao material. As nanopartículas são conhecidas na literatura por promover atividades antimicrobianas e que podem ser associadas a capacidade de absorção de contaminantes dos carvões ativos.
A inovação encontra-se em análise pelos pesquisadores, que buscam entender qual é a relação estabelecida entre as nanopartículas de prata no carvão ativo de bagaço e o meio ambiente. “A avaliação proativa dos riscos de nanomateriais é uma nova abordagem que a nanotecnologia está trazendo. Estes estudos estão sendo conduzidos no CBCIN e com a colaboração da Embrapa Ambiente. Preparamos o material ao mesmo tempo que já pensamos nos seus potenciais efeitos toxicológicos e riscos ambientais”, finaliza Martinez.
O Centro Nacional de Pesquisa em Energia e Materiais (CNPEM) é uma organização social qualificada pelo Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações (MCTIC).