por: Nancy Araújo de Souza
Nem me lembrava mais da sua existência, entretanto, há algum tempo sua figura me vem à memória com certa frequência. Não me refiro ao doce tão brasileiro presente nas festas infantis, nem ao comandante de alguma brigada. O Brigadeiro a que me refiro foi personagem presente na minha infância no interior de Minas. Lembro-me dele sempre sujo, mal vestido, escornado na porta de um armazém, encostado na parede, com o chapéu de palha caído escondendo metade do rosto onde se destacava um bigode preto. Ali dormia por horas. Não incomodava ninguém nem era incomodado. Era apenas um bêbado a mais na pequena cidade. Levantava-se e sumia reaparecendo depois em outro local, sempre bêbado. Às vezes deitava-se sob uma árvore no jardim da praça, na calçada de uma casa, ou recostado num muro.Sol a pino não o perturbava. Era inofensivo, apenas um homem marginalizado que contava com a ajuda de pessoas que lhe forneciam o necessário para se alimentar e tomar cachaça.
Como ainda não estava na moda o “politicamente correto”, um dia alguém aquele tipo de “espírito de porco” resolveu fazer uma brincadeira com o Brigadeiro e enquanto ele dormia, passou no seu bigode um pouco da sujeira que um cachorro deixara por ali.Calor intenso, o cheiro ficou forte e o Brigadeiro acordou, abanou-se com o chapéu e saiu cambaleando enquanto dizia: “Epa! Sujaram aqui”. Na verdade o verbo que usou foi outro, mais feio. Levantou-se, apenas deu alguns passos inseguros e acomodou-se novamente. A situação se repetiu algumas vezes e o infeliz acordava incomodado pelo mau cheiro, ou alguém o chamava, por maldade, e ele mudava de lugar sempre dizendo que haviam sujado ali. Todos riam a valer. O fato é que o Brigadeiro, depois de mudar de lugar várias vezes, acabou dizendo: “Não tem jeito, sujaram foi o mundo inteiro.”
Por que tenho me lembrado muito do Brigadeiro nos últimos tempos? A cada dia uma sujeira maior que a outra despenca sobre nós, neste país abençoado por Deus e bonito por natureza. O mau cheiro nos incomoda e ficamos atordoados até que outra sujeira ainda maior nos surpreenda no primeiro noticiário do dia. Mal começamos a conviver com expressões que não faziam parte do nosso vocabulário, como Mensalão, Petrolão, Lava Jato, Propina, etc. despertamos com outras ainda mais estranhas ao nosso convívio como Tráfico de Influência, Lobby, Contas Secretas, Delação Premiada, Pedaladas Fiscais, Bolsa Empresários, etc
As pessoas de bem, trabalhadoras, corretas, pagantes de impostos sentindo o mau cheiro aumentar sabem que não há para onde correr. Parece que não há o que fazer para limpar tanta sujeira antes que apareçam outras. Ainda nos resta rir dos pronunciamentos infelizes daqueles coitadinhos que “não sabem de nada”, se dizem vítimas da imprensa e das oposições golpistas. Um tanto pessimista e me lembrando do Brigadeiro, só me resta dizer: Não tem jeito………..o Brasil inteiro!
* escritora/cronista – e-mail:nancya.souza@yahoo.com.br