Por: Nancy Araújo de Souza
Quando copiei a letra da música o fiz apenas porque desejava aprender para cantar sozinha. Canto o tempo todo, sou cria do rádio ligado o dia inteiro em casa antes da televisão chegar ao interior. Adquiri o hábito de cantar a qualquer momento. Canto na rua, no ônibus, canto no banho, cantava no trabalho e sempre tive facilidade para aprender as letras que me interessavam, hoje não tanto.
Um dia, uma amiga madeirense (da Ilha da Madeira) me enviou pelo Face o vídeo do cantor português que eu não conhecia. Fiquei muito feliz quando li o comentário dela “para aquela que adora abraços, a canção Dá-me um Abraço de Miguel Gameiro”. Achei o vídeo lindo. A letra pequena, que copiei imediatamente, me lembrou momentos significativos da minha vida. Coloquei-a na bolsa e quando saía, em qualquer local onde pudesse, tirava-a para cantar baixinho até aprender. Sala de espera, ponto de ônibus, fila de supermercado, etc. qualquer lugar era apropriado para pegar a letra e começar a cantar baixinho. A memória já não está ajudando muito e eu não queria esquecer a canção tão bonita.
Desejei ter o CD para ouvir as outras canções que certamente deviam ser muito bonitas também. Não encontrei aqui. Como ia viajar, pensei em comprá-lo em alguma loja nos aeroportos. Tinha certeza de que iria trazê-lo na volta.
Estava no aeroporto de Lisboa aguardando a conexão para Budapeste, passeando por ali com amigas para esticar as pernas depois de uma noite longa. Rodamos por muitas lojas e eu aproveitei para procurar o CD “Porta ao Lado”, sem encontrar, até que o cansaço nos levou ao encontro do restante do grupo e nos sentamos. De repente me lembrei do lugar onde poderia encontrar o CD. Levantei-me de súbito e avisei que ia procurar a livraria onde já havia entrado em outra ocasião, mania que tenho de visitar livrarias. Tinha certeza de que ali encontraria o CD do português com a canção que não saía da minha cabeça.
Em poucos minutos encontrei a famosa livraria e ao entrar, mal havia dado três passos eis que ouvi, Miguel Gameiro cantando “Dá-me um Abraço”. Fiquei arrepiada, juro. Sabia que ele cantava pra mim. A surpresa foi tamanha que quase gritei quero este CD! Nem senti vergonha de ter falado tão alto. O atendente me sorriu, aproximou-se e eu repeti as três palavras quase gritando de novo, o coração disparado: Quero este CD! Ele sorriu, então, meio sem graça e disse naquele sotaque português tão bonito: Infelizmente senhora, não o temos. Parei no meio da loja e disse: Mas é claro que vocês o têm. Ele está tocando… Fui caminhando para sessão de música e ele a meu lado repetiu que não tinha o CD, que era um vídeo que eu estava ouvindo.
Aí, eu quase chorei. Abri a bolsa e tirei a letra da canção, mostrei a ele e disse eu preciso desse CD, olhe como isso é importante pra mim, ando com a letra da canção na bolsa e fico lendo e cantando o tempo todo. Ele pediu que eu o acompanhasse até o balcão, e disse que ia verificar no computador. Eu, do lado rezando para ele encontrar. Nada, não tinha mesmo. Verificou a discografia do cantor e não havia um sequer. Fiquei muito desconsolada e ele perguntou se eu queria que ele encomendasse pra mim. Claro que quis e disse a data em que passaria por ali de retorno ao Brasil. Ele anotou meu nome e prometeu conseguir o CD.
Saí da livraria e voltei toda jururu para junto dos meus amigos e contei a história. Todos ficaram consternados, pois eu tinha certeza de que conseguiria naquele lugar. O fato de eu entrar na livraria no momento em que alguém colocou o vídeo e o cantor começou a cantar para mim, era um prenúncio. Já me sentia dona do CD.
Viajei bastante e, às vezes, pegava a letra e ficava cantando, devo ter ficado até um pouco inconveniente. Ninguém reclamou, a canção é muito bonita mesmo. Eu, eufórica, comentava que na volta ia trazer o CD e talvez comprasse mais de um para presentear pessoas especiais.
Ao fim da viagem, novamente no aeroporto de Lisboa fui logo avisando ao guia que precisava de uns minutinhos para passar na livraria, pagar e receber minha encomenda. Nenhum problema, eu teria tempo suficiente. Deixei a turma e me dirigi à livraria para receber um sorriso amarelo do rapaz que me atendeu dizendo que não havia conseguido o CD.
Não acreditei. Quase chorando, pedi para ele verificar novamente e ele o fez com a maior atenção. Não tinha conseguido mesmo. Pediu desculpas e eu saí com aquela carinha de cachorro a quem ofereceram um osso e não lhe deram. Os amigos me consolaram e eu disse: Não tem problema é apenas algo que eu desejei e não pude ter. Não foi a primeira vez nem será a última.
Hoje encontro a canção na internet e a ouço quando desejo. Mas um dia ainda comprarei o CD. Afinal, sou ou não sou “aquela que adora abraços”?