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Difícil Ficar Sem Ele

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31/03/2016 - por Nancy Araújo de Souza

     Não sei exatamente por quanto tempo estivemos juntos, mas posso afirmar que mais de trinta anos se passaram desde que o recebi em minha casa. Sendo como sou, devo ter festejado e telefonado para todos contando a novidade, merecia mesmo ser festejado depois da longa espera. Para uma pessoa que morava sozinha, sua chegada foi providencial, foi um companheiro valioso. Preciso dizer, porém, que nossa relação nem sempre foi uma maravilha, não por culpa dele ainda que algumas vezes tenha me deixado na mão quando dele precisei, mas por outros fatores que não vêm ao caso no momento. Sempre relevava e não dava muita importância, ciente que sempre fui de que não existem relacionamentos perfeitos. Algumas vezes me aborreceu ao me acordar de madrugada, fazendo meu coração bater descompassado. O certo é que nunca pretendi nem pensei em ficar sem ele, mesmo sabendo que nada é para sempre.

    Com sua participação vivi momentos tristes, momentos felizes, dei gargalhadas e chorei muitas vezes. Recebi notícias maravilhosas e outras péssimas. Nos momentos de desespero com uma criança doente e febril ele me ajudou a encontrar o pediatra e pedir remédios na farmácia. Ajudou-me nas crises de enxaqueca quando eu mal conseguia ligar pedindo socorro a um dos irmãos. Mais tarde, nos episódios indescritíveis de refluxo, quando pensava que estivesse infartando,  com sua ajuda minha filha que ainda não dirigia, conseguia um táxi para me levar ao hospital. Vivemos assim até o mês passado. Então, por minha culpa fiquei sem ele e quase perdi a cabeça. Como foi difícil!
  
     Há alguns anos comecei a receber propostas indecentes para deixá-lo. Nunca levei a sério essas conversas  Tentavam me mostrar os  defeitos  que eu não percebia nele.  Procuravam me convencer de que eu merecia coisa melhor. Eu não dava ouvido, é claro. Ele me satisfazia plenamente nos aspectos que eu julgava importantes. Entretanto, as  tentativas de sedução continuavam. Comecei a perder a paciência e algumas vezes cheguei a ser grosseira. O problema é que essas pessoas são incansáveis quando decidem  nos infernizar a vida. Penso que são  sádicas. Teimam em não aceitar nossa recusa. Se somos educadas pensam que somos presas fáceis, e se os afastamos com mais firmeza nos chamam de antiquadas...

     Há um ditado que diz que “água mole em pedra dura...” e foi assim que caí em tentação. Também ninguém é de ferro! Com tanta oferta de maravilhas, quem há de resistir tanto tempo?  Chegaram a me oferecer mundos e fundos para eu deixá-lo e eu, ali, firme sem titubear. Jamais faria isso. Esqueci que “jamais” é muito tempo e eu sempre disse por brincadeira que  nunca seria fiel a qualquer coisa, marca ou pessoa, exceção feita ao amor de um homem enquanto fosse conveniente e me fizesse feliz.
 
    Falar de traição não é fácil. Falar de arrependimento também. Querer voltar o tempo é impossível. Quando percebi o tamanho do erro já era tarde. Tentar consertar, remendar o que parece não ter conserto é tarefa inglória. Fiquei sem ele e o outro não passava de propaganda enganosa. Quando me vi sem ele, definitivamente sem ele, avaliei a situação, reconheci o seu valor e quase me desesperei. Era mesmo o fim. Nos primeiros dias procurei sair mais e me distrair. Quando chegava em casa e me via sozinha, a falta dele ficava maior. Precisei avisar aos parentes e amigos a nova situação, enquanto tentava a todo custo que ele voltasse. Pedir perdão e tentar desfazer a besteira não adiantava. O telefone celular não teve descanso. Eram mensagens, Whatsapp, conversas longas e pedidos para desfazer o malfeito e nada adiantava. Os dias passando, minha filha me recriminando pelo ato impensado e eu sem ele. 

      Sou teimosa demais e não desisti. Está pensando o quê? Uma convivência de mais de trinta anos não se joga fora assim... Mas como, se  fui eu mesma que joguei tudo fora porque me ofereceram coisa melhor? Continuei tentando, quem sabe daria certo e “água mole em pedra dura...” Mais dias sem ele e a situação ficando quase insustentável. Não sabia mais o que fazer até  que decidi muito a contragosto, isto não é do meu feitio, apelar para a última opção: chantagem. Liguei o celular e quando a voz atendeu, tentei mais uma vez com delicadeza, pedindo desculpas, explicar como é difícil recusar tentações. Depois de ouvir que a separação era definitiva, quase chorando apelei para a chantagem e quase gritando, ameaçando chorar falei: Não posso mais ficar assim! Por piedade, veja como estou. Procure me entender...Não seja cruel com uma pessoa da minha idade!   
   Funcionou!!!!!!

     Quando ele voltou, de surpresa, a festa que fiz foi de espantar a vizinhança do meu andar, e deixar a cachorrinha cega louca de curiosidade e sair correndo, batendo a cabeça nos móveis e portas. Pulei, gritei, fiz papel de maluca abracei mais ainda minha filha. Liguei para os familiares e amigos contando a novidade.
 
    Juro que nunca mais, nunca mais mesmo, aceitarei o que qualquer  empresa de telefonia me oferecer para fazer a portabilidade que me deixou sem  telefone fixo por mais de duas semanas. Hoje estamos juntos de novo e garanto que é para sempre.  Agora continuo dizendo que nunca serei fiel a coisas, marcas, pessoas, exceto ao amor de um homem que me faça feliz e à certa companhia telefônica. Foi uma dura lição... 

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