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Sobre Everardo Maciel e Jabuticabas Tributárias

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07/12/2015

Everardo Maciel, secretário da Receita Federal no governo Fernando Henrique Cardoso, no período de 1995-2002, parece incomodado com o fato de terem comparado uma de suas criações tributárias, geralmente voltadas para beneficiar o capital e as camadas mais ricas da sociedade, com a jabuticaba, ou seja, com uma fruta que só existe no Brasil. Neste caso, trata-se da engenharia por ele feita, em 1995, para aliviar a cobrança do Imposto de Renda sobre as empresas, permitindo que os lucros distribuídos para os acionistas pudessem ser deduzidos como despesa, na forma de juros sobre o capital próprio, embora se estabelecesse uma alíquota de 15% para o acionista que os recebesse.

Em artigo no jornal O Estado de São Paulo, de 05 de novembro, intitulado “Sobre jabuticabas e clichês”, revela toda a sua mágoa com essa comparação, tentando desqualificar seus autores, ao afirmar que “[…] se o leitor identificar a lenda da jabuticaba sendo utilizada como argumento para refutar uma tese, [deve desconfiar] que o autor não estudou suficientemente o assunto”. E, defendendo sua medida como uma antecipação histórica do fisco brasileiro em relação ao resto do mundo, apontando que ”em um futuro remoto […] os juros remuneratórios do capital próprio e a isenção na distribuição dos resultados das empresas poderão ser outros exemplos de antecipações meritórias”.

A feliz comparação foi feita por Sérgio Gobetti e Rodrigo Otávio Orair em trabalho intitulado Jabuticabas tributárias e a desigualdade no Brasil: novas evidências a partir das declarações fiscais das pessoas físicas, no qual constataram, com base em dados da própria Receita Federal, ser regressiva a tributação no Brasil. De fato, como mostram estes autores, no ano de 2013, os contribuintes que ganharam R$ 4,2 milhões, em média, não pagaram mais do que 6,5% de imposto de renda, percentual que aumenta para 8,2% para os que receberam R$ 886 mil e para 11,13% para os que se situaram na faixa de R$ 440 mil. Já a classe média, que recebeu entre 20 e 40 salários, com renda média de R$ 226 mil, teria sido a mais penalizada com essa cobrança, transferindo para o fisco 11,96% de seus rendimentos mensais. Isso, somado ao peso excessivo dos impostos indiretos na estrutura tributária brasileira, configuraria, segundo os autores, um perfil regressivo do sistema.

Empregando argumentos estranhos à teoria das finanças públicas, Everardo pretende demonstrar que não se pode qualificar um sistema tributário como progressivo ou regressivo apenas com base na composição dos seus impostos. Confundindo as bases de tributação e trilhando um caminho equivocado para um técnico de seu nível, chega a sugerir que se o PIS e a Cofins incidentes sobre o consumo fossem classificados como impostos diretos e não como indiretos, o que não seria nenhum absurdo, já que têm, para ele, a mesma base do imposto de renda, ter-se-ia outro perfil de tributação e que este, nessa visão, que considera estreita e insubsistente, poderia passar de regressivo a progressivo. Simples assim.

Ora, na teoria, os impostos que são ou podem ser transferidos para terceiros, caso, entre outros, do PIS e da Cofins, são classificados como impostos indiretos, o que significa que não existe coincidência entre o contribuinte de direito e o contribuinte de fato. Só no caso em que o contribuinte de direito coincide com o contribuinte de fato, pelo menos teoricamente, é que são classificados como diretos, como é o caso do imposto de renda e de impostos sobre o patrimônio.

Everardo quer, com isso, subverter a teoria, transformando, a fórceps, impostos sobre o consumo em impostos sobre a renda, para refutar as conclusões do trabalho de Gobetti e Orair. Ora, se é verdade que o consumo tem origem na renda, isso não significa que essa é que está sendo taxada, pois se não existir o consumo não existirá também o imposto que sobre ele incide.

Mas Everardo quer ir mais longe em sua argumentação contra o que chama de clichês tributários. Acha uma grande bobagem, valendo-se de argumentos do pensamento dominante, o uso do imposto para a redução das desigualdades. Isso porque, para ele, os contribuintes têm capacidade de reagir ao aumento de impostos, deslocando seus recursos para países com tratamento tributário mais favorável, o que termina prejudicando os investimentos e o processo de acumulação.

Por isso, os fatores de alta mobilidade espacial devem ser poupados, e considera propostas como as de Piketty, que vinculam a tributação à redução das desigualdades, de uma “impressionante ingenuidade”. Para ele, que se coloca com esses argumentos como um gênio da tributação em tempos de globalização, não passa de tolice pretender, na atualidade, dar uma feição social para o imposto. A tributação não pode ser vista, dessa maneira, como um campo adequado para a promoção de políticas de redistribuição.

Despido, assim, do caráter social do imposto e, acreditando nos contos da carochinha do pensamento dominante, Everardo transfere essa responsabilidade para o crescimento econômico e para o gasto público, preservando da incidência do imposto o capital e as altas rendas para não afugentá-los do país, dada sua alta mobilidade espacial. Por isso, o peso da tributação deveria ser lançado sobre os fatores de baixa mobilidade espacial, casos do consumo, dos trabalhadores menos qualificados, da propriedade imobiliária etc., ou seja, de uma forma geral, sobre os ombros mais fracos.

Ora, se isso fosse verdade, o Brasil seria pequeno demais para receber o fluxo de capitais que para cá se dirigiria em busca de um tratamento tributário mais favorável por ser, indiscutivelmente, o país que possui um dos sistemas mais camaradas do mundo na cobrança de impostos sobre o capital e as altas rendas. Isso, não somente em relação aos países desenvolvidos, mas também a muitas economias emergentes. Se a tributação tem influência sobre este movimento de capitais, existem outras causas, ignoradas por Everardo, que balizam as decisões, especialmente do capital produtivo, sobre estes deslocamentos.

A verdade é que os argumentos do pensamento conservador, como o da competitividade tornada norma superior da tributação, para justificar a isenção ou a baixa incidência de impostos sobre os mais ricos e poderosos, não passam, estes sim, de verdadeiros clichês para ludibriar a população sobre essa questão.

Se, como argumenta, a redução das desigualdades só deve contar com o crescimento econômico e com a política de gastos do Estado, não ocorre, a Everardo, que, na ausência do primeiro, as condições sociais tendem a se agravar – e muito! – e de que o segundo tende, de uma maneira geral, a favorecer exatamente os mais ricos que mais influenciam e determinam a política econômica e de gastos do Estado.

Isso, além do fato de que, se não envolver os detentores da renda e da riqueza nos custos dessa política, será curto o fôlego do Estado para sustentar políticas dessa natureza por um período mais prolongado, já que se defrontaria, em pouco tempo, com limitações fiscais, com tem ocorrido no Brasil. Somos assim levados, de acordo com a sua visão, ao pior dos mundos: O Estado operando como um Robin Hood às avessas, tirando dos mais pobres para dar aos mais ricos, para o que as suas jabuticabas muito contribuíram.

Como secretário da Receita Federal, Everardo conseguiu aumentar a carga tributária no Brasil, em sua gestão, de 29,7% do PIB, em 1994, para 32%, em 2002, sem realizar nenhuma reforma importante em sua estrutura. Foi, por isso, considerado um técnico prodígio estritamente em termos de arrecadação, tornando-se objeto de desejo de governantes que só veem o imposto como meio para expandir suas receitas. Quando, no entanto, se arrisca a emitir opiniões sobre o papel social do imposto, com argumentos falazes, revela toda sua essência como defensor despudorado do capital e das camadas mais ricas da sociedade.

*Publicado originalmente em Plataforma Política Social.

** – Fabrício Augusto de Oliveira é doutor em economia pela Unicamp, membro da Plataforma de Política Social, colaborador do Brasil Debates e Folha Diária, e autor, entre outros, do livro “Economia e política das finanças públicas no Brasil: um guia de leitura”.

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