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O Luthier ou O Homem e o Tronco

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03/07/2016

Por  Nancy Araújo de Souza

As amigas ficaram em silêncio, ouvindo a leitura do texto que ela acabara de escrever. Já conheciam a história que ela relatara cheia de emoção, dias antes. Falou das dificuldades que se apresentaram quando tentou escrever. Da vontade de desistir e também da perseverança que a persegue desde sempre. Quando era criança, diziam que ela era teimosa.

Teimosia, persistência ou tenha o nome que tiver, a verdade é que não gosta de desistir de nada e foi à luta.”Lutar com palavras é luta mais vã” assim disse o poeta.Terminada a leitura recebeu a aprovação das ouvintes, então disse emocionada: parece que consegui.
            
Foram três as tentativas  de escrever sobre aquele momento tão especial, mas ficou novamente em dúvida. Não queria repetir a frustração de saber-se incapaz de relatar algo, que a princípio parecia tão fácil. Na primeira tentativa, assim que chegou de viagem, ficou pensativa e abatida diante da tela sem nada conseguiu digitar enquanto revia na memória aquela cena inesquecível. Chegou à conclusão de que não poderia descrever aquele momento, apenas conseguia sentir a sua beleza. As palavras se recusavam a obedecer e ela desistiu. A segunda tentativa foi um tanto traumática. Primeiro reviu na memória todos os detalhes e então começou a escrever, ia ser fácil, entretanto as lembranças, aos poucos, foram se desfazendo e tudo ficou vazio. Só viu o sol, a claridade ofuscando sua visão e a imagem desfocada foi sumindo e desapareceu devagar. Chorou com vontade e desistiu. Nunca mais tentaria.

Por que não conseguia redigir? Como alguém consegue falar sobre algo e não consegue redigir uma linha sequer sobre  aquilo?  Várias vezes procurou refazer aquele instante em pensamento. Estava tudo ali na memória, todos os detalhes, todos os sentidos, os sentimentos... Só não podia passar para o computador... Era muito estranho. Talvez por ser um momento tão seu, tão especial que inconscientemente não desejava repartir com ninguém. O coração tem razões que a própria razão desconhece.
 
Resolveu tentar mais uma vez. É mesmo teimosa. Não ia se importar se errasse algum detalhe, se esquecesse algum pormenor, se inventasse uma particularidade, se mentisse sem querer, ou se omitisse alguma informação. Não podia deixar aquela imagem desvanecer aos poucos até desaparecer por completo da sua memória. Tinha que escrever. Registrar. Divulgar. Compartilhar. Valorizar. Ainda que com falhas, ficará registrado, se a memória se perder, o que parece inevitável, a descrição do momento sobreviverá.

As três subiam a rua estreita pois se dirigiam à Quinta das Cruzes para o evento  Música Conversada, quando passando pela oficina do luthier  resolveram entrar  para uma visita rápida, bem rápida. Ainda era cedo para a palestra, naquela tarde, de responsabilidade do escritor, pesquisador, professor e músico da maior relevância no lugar. Não queriam perder o encontro.
 
Por muito pouco não perderam a palestra, porque não foi fácil sair da oficina de confecção de instrumentos, onde o luthier passou a discorrer  sobre seu ofício e elas ouviram com atenção. De repente, um amigo dele chegou pedindo ajuda para retirar do carro um tronco de madeira que havia trazido. Ele pediu licença e saiu por um momento para ajudar. Elas ficaram distraídas observando os instrumentos, as ferramentas, enquanto fotografavam o ambiente ouvindo Sylvinha Telles  que ele ouve o tempo todo no computador.

Ela estava sentada um pouco mais afastada quando ouviu o ruído e olhou para fora. Não conseguiu, a princípio, entender o que via. A luz do sol era forte naquele fim de tarde. A claridade ofuscava sua visão. Era uma imagem desfocada de algo estranho que ela só percebeu depois de alguns segundos. Conseguiu identificar o homem sorridente entrando na oficina, abraçado ao tronco, demonstrando tanta alegria e emoção como se fosse uma só matéria, um só corpo… E expressava felicidade, quase êxtase...

Ela ficou sem fala com a beleza daquela imagem. O homem e o tronco unidos eram um deslumbramento! Quando ele deixou o tronco num canto com cuidado, começou a falar da árvore. Contou sobre o local de onde viera o tronco.  Discorreu sobre o pinheiro manso e o pinheiro bravo, que ela nem conhecia, sobre outras madeiras de outros países, o tempo necessário para uma madeira estar pronta a ser trabalhada, mostrou o sentido dos veios, os cortes, etc.  Elas saíram emocionadas e enriquecidas de ensinamentos.

Quando retornou à oficina em outra tarde, teve coragem de contar ao homem a sua impressão sobre ele e o tronco naquela tarde. Não foi fácil descrever o que a  encantara, ficava engasgada, as palavras sumiam, mas conseguiu falar. Ele a ouviu de olhos arregalados e ela percebeu a emoção nos seus olhos. Quando terminou, ele a olhou tentando conter as lágrimas e disse: “Você percebeu. Eu e a madeira somos uma coisa só”! Ela já sabia...

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